terça-feira, 6 de abril de 2010

Menos popular, mais enxuta, mas sempre romântica e escrachada


Menos gritaria, mais economia vocal. Menos quantidade de músicas e mais participação de artistas estrangeiros. Mais samba que o de costume, porém, menos canções radiofônicas. Prestes a completar 35 anos, Ana Carolina se enxerga mais madura e lança álbum pseudo cult. Após uma enxurrada de hits que marcaram a lista das canções mais executadas nos últimos 10 anos no país, “N9ve” chega às lojas com uma roupagem de uma artista que se contém em esbravejar que é feita “pro amor da cabeça aos pés” e sem uma promessa de hit arrebatador. Mais cosmopolita, ela continua a falar de seus sentimentos, porém de forma mais branda. Não obstante, os temas de seus versos permanecem os mesmos: a sexualidade, o tom de confissão e o amor escrachado e sem pudor. A seguir, parte da entrevista concedida a Tribuna da Bahia em meio a uma reforma de seu apartamento, no Rio de Janeiro.


Nomeado de “N9ve”, a Sony/BMG lança o oitavo álbum de Ana Carolina - incluindo na discografia a coletânea “Perfil”. Em 2009, a artista celebra uma década de uma das carreiras mais bem sucedidas da geração recente da MPB com o disco que faz menção ao seu primeiro, já que este foi lançado em 1999. O título lembra outras coincidências (ou não) do número que tanto a acompanha, como seu nascimento no dia 9 do nono mês. Por isso, o preço sugerido de venda do CD será R$19,99 e a tiragem inicial de 99.999 unidades.

Neste álbum, a cantora e compositora traz samba em duas faixas, flerta com tango, programação eletrônica, jazz, soul. Um repertório diversificado, embora com apenas nove faixas – propositalmente para manter a linha mística do projeto. Um dos sambas, “Torpedo”, é fruto de uma melodia sua com Mombaça que recebeu letra de Gilberto Gil. “Ah! Vamos dando risada, que a vida nos chama, não dá pra chorar” é a mensagem que diz o refrão bem-humorado do outro samba “Tá rindo, é?” (Ana Carolina / Mombaça / Antônio Villeroy).

Com o norte-americano John Legend, a brasileira compôs e gravou em dueto a bilíngue “Entreolhares” (“The way you’re looking at me”), o carro-chefe do disco (que também é assinado por Villeroy). Também dos EUA, Esperanza Spalding insere jazz em voz e baixo na faixa “Traição” (Ana Carolina / Chiara Civello). Essa última co-autora é a outra parceria gringa no CD, a mais extensa delas. Chiara é italiana e assina com Ana, além de “Traição”, “10 minutos, “8 Estórias” e “Resta”, com a qual também divide os vocais. Essa faixa, que ainda foi composta por Dulce Quental, é cantada parte em português, parte em italiano. Em “Dentro” (Ana Carolina / Dudu Facão) ela mantém seu romantismo e em “Era” (Ana Carolina) exibe um “eu” que não está nem aí para o passado e que não é filho de Deus, nem do Diabo, mas sim do amor – diz a letra.

A carreira de Ana Carolina é marcada pelo sucesso comercial. O rastro que ela tem deixado na mídia não é pequeno, galgado, até então, com a força de um punhado de interpretações inseridas em trilhas de novelas – já são 13, todas da Globo. Esse fato a arremessou ao topo, lhe rendendo impulso para a sólida popularização no Brasil. Mas a mineira, de Juiz de Fora, que tem em sua estante uma batelada de prêmios Multishow (cinco ao todo), entre outros troféus, e indicação ao Grammy, parece buscar também reconhecimento da crítica que não responde tão positivamente quanto as vendagens dos discos. Tudo bem, a evolução pode ter sido natural e uma leve dose de sofisticação pode ter chegado com o amadurecimento. De certo é que sua versão enxuta e “mais cult” é menos popular. Isso é.


Quando você começou a pensar no disco? Quanto tempo sua produção durou?
Ana Carolina - Essas músicas do N9ve começaram a surgir no meio da turnê Dois Quartos. Eu componho muito na estrada, em quarto de hotel. O processo em estúdio durou três meses.

Inicialmente a idéia já era fazê-lo tão diferente dos outros?
AC - Primeiro fiz as canções, depois fiz o álbum. Acho que acertei em fazê-lo mais enxuto, mais econômico. Esse disco é mais cult!

A idéia do título surgiu por acaso ou isso já veio com a concepção dele?
AC - O número nove tem uma presença tão constante na minha vida – nasci em 9 de setembro (mês nove) e lancei meu primeiro disco em 1999 – que decidi homenageá-lo na hora de dar nome ao novo CD.

Percebo que as canções estão menos radiofônicas neste álbum. Você concorda? Não há mais preocupação com o sucesso como, talvez, outrora existisse ou você já se sente confortável e segura para avançar no seu gosto pessoal e experimentar mais?
AC - Nem pensei nisso. Acho que é um disco diferente, um marco na minha carreira. Mas minhas canções, o violão, estão ali, feitas do meu jeitinho. Concordo que os sambas fazem o diferencial, em nove faixas dois sambas é muito.

Como foi a escolha dos parceiros na gravação do disco?
AC - Conheci a Chiara aqui no Rio, o Daniel Jobim nos apresentou durante um sarau. Nos encontrávamos para tocar e as músicas iam saindo, naturalmente. A primeira foi “Resta”, depois vieram as outras que estão no disco. Com relação ao John Legend, já gostava do trabalho dele. Mandei a música por e-mail, ele gostou e resolveu fazer uma letra em inglês e cantar. Já a Esperanza eu tentava encontrar havia um bom tempo. Tinha ficado impressionada ao ouvi-la cantar e tocar baixo. Por coincidência, ela é amiga do Alê (Siqueira), que produziu a faixa e a chamou.

“Hoje em dia não me importo com o que fiz do meu passado” (...) “E não rebato se disserem por aí que estou errado”, diz a faixa “Era”. Como você encara críticas a sua vida e ao seu trabalho. Realmente não está nem aí? Faz questão de lê-las ou ignorá-las?
AC - Acompanho o trabalho dos críticos no Brasil. Quando o cara merece e percebo que está tentando acertar, pego o telefone e ligo para ele. Se eu vejo que é uma implicância, que o cara não é sério, não ligo.


*matéria originalmente publicada em
13.08. 2009 na Tribuna da Bahia
*fotos de André Schiliró
* texto de Dimas Novais

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