terça-feira, 4 de maio de 2010

Os ensolarados Paralamas



Luminosos como nunca – pelo menos após o acidente que vitimou o front-man Herbert Vianna – os Paralamas do Sucesso chegam a Salvador para apresentar “Brasil Afora”, nova turnê do grupo


O sol que irradiava a carreira dos Paralamas do Sucesso foi encoberto, em 2001, pelo acidente que deixou seu vocalista, guitarrista e principal compositor, Herbert Vianna, paraplégico e matou a jornalista inglesa Lucy Needhan-Vianna, sua esposa. Oito anos depois, no terceiro álbum da carreira do grupo após a tragédia, o sol parece ter voltado a iluminar o trio composto também pelo baixista Bi Ribeiro e pelo baterista João Barone. Da casa onde a turnê “Brasil Afora” tomou suas primeiras formas, Barone (o morador) concedeu entrevista à Tribuna da Bahia e falou sobre a ensolarada turnê que passa por Salvador, nesse sábado, no Cais Dourado Music Hall, Comércio. Marcado para as 22h, o show único está com os ingressos à venda por R$40,00 (meia entrada de pista) e R$70,00 (preço único de camarote) e podem ser adquiridos nos Balcões Ticketmix (shoppings Barra, Iguatemi e Sumaré), Loja Iguana Villas (shopping Estrada do Coco) e bilheterias da casa no dia do evento. Classificação: 16 anos.

“As coisas funcionam num processo randômico”. Essa foi a definição mais constante de João Barone para tudo o que os Paralamas fazem. Tudo muito natural. Os discos, as parcerias, os shows, os ritmos. Talvez isso justifique o largo tempo despendido para a produção do mais recente álbum da banda, “Brasil Afora”, lançado em fevereiro deste ano e que nomeia a turnê. “A gente ficou quase um ano e meio se debruçando sobre o repertório, começando no início de 2007.” E na Bahia, houve uma um componente a mais para o disco: Carlinhos Brown. “Parte do processo aconteceu no estúdio de Brown (Ilha dos Sapos em Salvador). Mais pela ‘vibe’, pela atmosfera, do que por qualquer outra coisa”, disse.

Curiosamente, Barone considera o mais trabalhoso entre as etapas de concepção de um CD, o de nomear as faixas. “A gente acaba colocando versos das músicas. Tentamos sempre fugir do clichê”. A despeito disso, o nome do álbum acabou ficando mesmo “Brasil Afora”, título de uma das canções. Foram dois meses de busca criativa para que se chegasse a um outro nome, mas, de todo caso, acabou sendo oportuna a idéia que ele sugere. A expressão “vai ao encontro da idéia de estrada que é muito a nossa cara nesse momento, de querer tocar em qualquer lugar onde a gente possa chegar”, como na cidade de Lucas do Rio verde (MT) onde pisaram pela primeira vez na terça-feira da semana passada. A cerca 350km da capital Cuiabá, eles não esperavam que o público fosse numeroso, mas foram surpreendidos por 15 mil espectadores. “Paralamas é banda de palco”, conclui.


Respeito quanto ao tempo
Foi o clima tranqüilo que o estúdio de Barone proporcionou ao trio o fator propulsor para o grupo utilizá-lo intensamente – algo que não se repetia desde a pré-produção do Acústico MTV (lançado em CD e DVD), dez anos atrás. Foi nele também que Carlinhos Brown mostrou as músicas que tinha em mãos como sugestão para a banda gravar. “Acho que vamos continuar fazendo isso. O Acústico começou a ser bolado essencialmente aqui, assim mais coloquial, sem hora pra começar, nem pra terminar.” De Brown ficaram duas faixas: “Sem Mais Adeus”’, composta com Alain Tavares, e “Quanto ao Tempo”, com Sullivan. Essa última, depois do reggae dos Paralamas foi transformada para um blues jazzístico, à la Motown, numa regravação recente em dueto entre Brown e Ivete Sangalo.

“A gente respeita muito a inspiração, mas claro que é preciso ir atrás dela”, frisa. Quanto à gravadora, eles estão sem uma “normal” nesse momento. Normal quer dizer, não estão vinculados de modo contínuo a nenhuma. O último disco foi distribuído pela EMI, mas o próximo não se sabe. “A gente tá mais franco atirador em matéria de distribuição”, admite ele que também conta que os Paralamas levaram um tempo para se adaptar às novas condições de comercialização da música.

Houve “respeito” também ao processo de perceber como o disco foi recebido pelo público e a repercussão que ele teve para que, então, pudessem definir um novo show e uma nova turnê posteriormente se iniciar. Sem pressa, cenografia, iluminação e repertório novos foram arquitetados. “Pra nossa sorte esse processo foi muito legal. Aqui no Rio e em São Paulo foi muito positivo”. Avaliação feita, os Paralamas partiram para mais uma jornada de palcos Brasil adentro.
“Conseguimos roteirizar o show de uma forma legal. Costuramos bem as músicas velhas e o novo material”. Diálogo esse que Barone assume não existir no disco. De acordo com ele, o encaminhamento do álbum não foi previamente idealizado – assim como o show que está se desenhando a cada apresentação. Mais de vinte músicas foram compostas e delas 12 foram pinceladas e amadurecidas para compor o registro, mas sem ligações diretas (rítmicas ou discursivas) umas com as outras. “Jogamos dados para ver o que acontece”, diz. O que se pode afirmar de confluência entre as faixas são os “lugares” citados arduamente por Herbert, o grande compositor da banda, a exemplo de “Mormaço” que cita a cidade Propriá, município de Sergipe. Mas um alerta: “lugar pode não ser um ponto geográfico, mas uma memória”.



Chiaroscuro
Na música, na pintura, na fotografia, se explora muito o claro e o escuro, dicotomia que dá o tom de luminosidade a arte. É o que se chama, em italiano, de “chiaroscuro”. Sem saber, Barone estava explicando o sentido nominal do título do novo álbum da baiana Pitty. “É mesmo, veja só. Interessante, Não sabia”, diz entre risos. “Ela já é um ‘mainstream’ (o que já é conhecido pelas massas) e se eu não me engano esse é o terceiro disco de inéditas dela (acertou!). É a hora de ver se a chapa é quente mesmo”, comenta, acreditando que esse é o momento dela mostrar que já se firmou no mercado. Ele, que disse estar curioso para ouvir o novo trabalho da roqueira, finaliza “É uma hora muito importante de tentar ir além e não ficar correndo atrás do próprio rabo”.

Os projetos futuros do grupo incluem um registro em DVD desta turnê a ser filmado, talvez, em uma pequena cidade “interessante” do interior do Brasil, segundo Barone. Além disso, a relação do grupo com a Argentina está prometida para um reenlace em breve, o que deve abarcar algumas parcerias com compositores e artistas de lá. Com menos demora que da última vez, eles pretendem voltar com o processo de composição de um outro disco de inéditas porque muito material ficou de fora de “Brasil Afora” – o que não é comum na banda. Foram quatro anos até que um novo CD completamente inédito fosse lançado. O próximo deve sair em menos de três anos, promete João Barone.

Após o acidente que vitimou Herbert, este é o trabalho mais ensolarado do grupo. Na capa, no nome, nas letras, nos ritmos, o sol brilha mais. Embalada pelo single “A Lhe Esperar”, executada nas rádios desde janeiro, essa vivacidade (supõem-se) deve se refletir nas apresentações do grupo durante a turnê, o que em Salvador não vai ser difícil acontecer – posto que a cidade é calorosa por natureza. Aguardemos a noite do próximo sábado, então, pra sentir essa luz que o grupo propõe emanar.




*matéria originalmente publicada em 12.08. 2009 na Tribuna da Bahia


*fotos de Mauricio Valladares
* texto de Dimas Novais


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