As mais belas garotas, o sol mais relaxante e o baixo custo de drogas. Deslumbrado com uma nova realidade de vida que encontrara em terras brasileiras, Rodger Klingler decide se arriscar a fim de tirar proveito das facilidades que o país lhe oferecia. Da fria e úmida Alemanha, ele saia em direção a um paraíso ensolarado chamado Brasil. Mas o que encontrou foi um mundo sujo, corrupto e infernal. Em “Memórias do Submundo – um alemão desce ao inferno no Rio de Janeiro”, ele conta de forma biográfica seus quatro anos de reclusão nas penitenciárias de Água Santa, Galpão e Lemos de Brito, essa última, a maior do Estado da Bahia. A obra literária de 384 páginas, da Editora Best Seller, já está à venda.
Em sua terceira visita ao Rio de Janeiro, Rodger Klingler tinha um objetivo traçado: comprar um quilo de cocaína para contrabandeá-lo de volta para a Alemanha. Na tentativa de deixar o país, em 1984, ele foi detido e teve que encarar humilhações e aprender com a vida que levou nos quatro anos subseqüentes, o valor de um cobertor, de um colchão, de uma simples escova de dente e principalmente da honestidade. “Tem lugares neste mundo que a vida humana não vale nada. Mas no mesmo lugar também há amor, calor humano. Aprendi a sobreviver nos chãos e mais, a conviver com estas situações”, conta Klingler, diretamente de Ingolstadt, Alemanha, onde vive com sua esposa e uma filha de 13 anos. Lá, ele trabalha com jovens desajustados numa escola da cidade, perto de Munique.
Em sua passagem pelo maior complexo penitenciário da Bahia, ele já era experiente no assunto, pois havia estado por outras duas prisões. Por lá permaneceu cerca de dois anos e meio. E foi lá que conheceu o prof. Arthur, quem, segundo Klingler, o fez um homem honesto. “Na verdade, virei outro homem. De Saulus à Paulus.” Para o alemão, apesar de toda cadeia ter suas peculiaridades, todas são verdadeiros infernos, submundos. “Ninguém neste mundo merece uma coisa destas”, pontua. Sobre esse período de sua vida carcerária, relata um trecho de seu livro: “Aqui no Lemos de Brito a coisa era totalmente diferente do que eu havia conhecido até então. Eu não podia acreditar nos meus ouvidos quando, no meu primeiro sábado, logo depois das 14h, ouvi de repente vozes de mulheres no corredor. Podia ser verdade? Sim, estava certo. (...) Por mais que se pudesse ter uma impressão negativa dos presídios brasileiros, no que diz respeito a visitas eles eram substancialmente mais humanos que na Alemanha, onde é preciso se dar por satisfeito com apenas duas horas por mês, e isso com supervisão de um funcionário”.
Registro de tristes impressões
O livro começou a ser idealizado 15 anos atrás, uma década depois de sua prisão. Ele, que queria chamar a atenção para as condições dos presídios do país, conseguiu alcançar seu objetivo: a obra é chocante desde as primeiras páginas. “Como escritor, achei que a história valia a pena ser escrita. Também foi uma promessa que fiz ao prof. Arthur”, explica. Em apenas cinco meses escreveu a biografia, finalizando-a em 2004. Mesmo depois de ter registrado sua história na obra – certamente ele não se orgulha dela -, Klingler conta que seus familiares não o perdoaram pelo crime que cometeu. Sobre a saída da prisão e a tentativa de retorno ao convívio em sociedade, comenta: “foi duro porque tinha que organizar a minha vida novamente. Mas nos piores momentos, a gente cresce e aprende. O pior de tudo é que a minha família não quis saber mais de mim, até hoje. Paguei um preço muito alto pelo que fiz”.
Rodger Klingler ainda assim acredita na reeducação de um detento. Mas, para isso, o sistema prisional do Brasil precisa sofrer mudanças. “O governo tem que criar as circunstâncias para que isto possa virar realidade“, afirma. “Em Memórias do Submundo”, percebe-se o porquê. Corrupção, violência consentida e ódio acumulado são algumas das mazelas incessantemente alimentadas por um sistema desumano. Ressocialização? Página a página, o leitor vai entender, através de relatos detalhados, o motivo de carcerários brasileiros fugirem ou mesmo cumprirem suas penas e depois retornarem à sociedade mais violentos e perigosos. Para o alemão, a experiência foi uma dura lição aprendida. Enquanto o submundo parece ter lhe feito um ser humano melhor e mais forte, suas memórias são hoje seu impulso para dar rumos mais saudáveis à própria vida, é o que ele garante.
Em sua passagem pelo maior complexo penitenciário da Bahia, ele já era experiente no assunto, pois havia estado por outras duas prisões. Por lá permaneceu cerca de dois anos e meio. E foi lá que conheceu o prof. Arthur, quem, segundo Klingler, o fez um homem honesto. “Na verdade, virei outro homem. De Saulus à Paulus.” Para o alemão, apesar de toda cadeia ter suas peculiaridades, todas são verdadeiros infernos, submundos. “Ninguém neste mundo merece uma coisa destas”, pontua. Sobre esse período de sua vida carcerária, relata um trecho de seu livro: “Aqui no Lemos de Brito a coisa era totalmente diferente do que eu havia conhecido até então. Eu não podia acreditar nos meus ouvidos quando, no meu primeiro sábado, logo depois das 14h, ouvi de repente vozes de mulheres no corredor. Podia ser verdade? Sim, estava certo. (...) Por mais que se pudesse ter uma impressão negativa dos presídios brasileiros, no que diz respeito a visitas eles eram substancialmente mais humanos que na Alemanha, onde é preciso se dar por satisfeito com apenas duas horas por mês, e isso com supervisão de um funcionário”.
Registro de tristes impressões
O livro começou a ser idealizado 15 anos atrás, uma década depois de sua prisão. Ele, que queria chamar a atenção para as condições dos presídios do país, conseguiu alcançar seu objetivo: a obra é chocante desde as primeiras páginas. “Como escritor, achei que a história valia a pena ser escrita. Também foi uma promessa que fiz ao prof. Arthur”, explica. Em apenas cinco meses escreveu a biografia, finalizando-a em 2004. Mesmo depois de ter registrado sua história na obra – certamente ele não se orgulha dela -, Klingler conta que seus familiares não o perdoaram pelo crime que cometeu. Sobre a saída da prisão e a tentativa de retorno ao convívio em sociedade, comenta: “foi duro porque tinha que organizar a minha vida novamente. Mas nos piores momentos, a gente cresce e aprende. O pior de tudo é que a minha família não quis saber mais de mim, até hoje. Paguei um preço muito alto pelo que fiz”.
Rodger Klingler ainda assim acredita na reeducação de um detento. Mas, para isso, o sistema prisional do Brasil precisa sofrer mudanças. “O governo tem que criar as circunstâncias para que isto possa virar realidade“, afirma. “Em Memórias do Submundo”, percebe-se o porquê. Corrupção, violência consentida e ódio acumulado são algumas das mazelas incessantemente alimentadas por um sistema desumano. Ressocialização? Página a página, o leitor vai entender, através de relatos detalhados, o motivo de carcerários brasileiros fugirem ou mesmo cumprirem suas penas e depois retornarem à sociedade mais violentos e perigosos. Para o alemão, a experiência foi uma dura lição aprendida. Enquanto o submundo parece ter lhe feito um ser humano melhor e mais forte, suas memórias são hoje seu impulso para dar rumos mais saudáveis à própria vida, é o que ele garante.
*matéria originalmente publicada na edição da Tribuna da Bahia do dia 10.10.09
*fotos por Edgar de Souza
*fotos por Edgar de Souza
Sem palavras, o texto tá incrivel, já tinha observado o livro em sua casa, agora quero muito ler.
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